JOSÉ ALBERTO LOURENÇO | ECONOMISTA
ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2023
Os trabalhadores da Administração Pública, e em particular os da Administração Local, exigem que o governo PS dê resposta à necessidade e à urgência da sua valorização, após mais de uma década de estagnação salarial, e que aplique a fórmula de actualização das pensões e reformas de acordo com a lei em vigor.
O Orçamento do Estado (OE) para 2022 foi aprovado há cerca de dois meses, mas – e sem o grande risco de podermos ser desmentidos – será pouco mais do que um nado-morto. O atraso na sua aprovação poderia ter sido aproveitado para fazer dele um documento mais equilibrado e justo, e para o governo PS rever as suas projecções macroeconómicas, nomeadamente as da inflação, e, em consequência, proceder a uma actualização intercalar dos salários dos trabalhadores da Administração Pública – em particular os da Administração Local – e à reposição de valores de reformas e pensões um pouco mais decentes.
Mas, conhecendo nós “o que a casa gasta”, o Governo não teve, ao longo dos seis meses em que preparou e levou à discussão o OE 2022, qualquer preocupação com o impacto que a forte subida da inflação estava permanentemente a ter na degradação das condições de vida de milhares de milhares de trabalhadores da Administração Local.
Já a discussão do OE 2023, por seu lado, será efectuada num contexto político, económico e social, interno e externo, dos mais complexos dos últimos anos.
AUMENTAR PENSÕES E REFORMAS EM 7,3%
Em termos externos, a guerra na Ucrânia (que parece não acabar), a inflação que não abranda e as taxas de juro que o Banco Central Europeu (BCE) controla, e que iniciaram já uma trajectória ascendente, constituem um conjunto de “nuvens negras” que ameaçam o nosso país, podendo trazer atrás de si uma “tempestade perfeita”, pronta a desabar sobre a nossa economia, com efeitos devastadoras sobre os trabalhadores e suas famílias.
Sabendo que os actuais níveis de inflação trazem consigo uma forte quebra do poder de compra, não podemos ignorar que as subidas das taxas de juro vão, por si só, acarretar um agravamento muito considerável nas prestações mensais dos empréstimos à habitação, de que dependem mais de um milhão de agregados familiares, sendo previsível que este agravamento possa atingir mais de uma centena de euros nos próximos meses e anos.
Nos últimos meses, temos ouvido do Governo – e até mesmo do Presidente da República – promessas de que, em 2023, será aplicada a fórmula de actualização das pensões e reformas de acordo com a lei em vigor. A acontecer, desde já que nos devemos congratular todos com a aplicação da mesma, porque certamente não passaria pela cabeça de quem engendrou tal fórmula, que a sua aplicação desse, em algum ano, os resultados que dará para 2023.
É que, pela aplicação da lei – que conjuga um elevado crescimento médio do PIB no corrente ano e no ano passado (acima de 4%), e uma elevada inflação este ano (entre 6,5 e 7%) –, a esmagadora maioria das pensões e reformas deverão ter, no início do próximo ano, uma actualização em torno dos 7,3%. Desta forma, e pelo menos por uma vez, os pensionistas e reformados terão uma actualização de pensões que compensará a inflação suportada no ano anterior, repondo-se, muito justamente, o seu poder de compra.
Refira-se que isto só foi possível porque, após um ano (2020) da maior recessão de que há memória com o PIB a cair 8,4% ao ano, a retoma da actividade económica atingiu naturalmente, ao fim de dois anos, o nível de 2019, permitindo assim que os reformados e pensionistas viessem disso a poder beneficiar.
COMBATER A POLÍTICA DE BAIXOS SALÁRIOS
Esta será uma questão importante e que dominará, certamente, a discussão do OE 2023, tendo o governo PS de justificar como é que, havendo dinheiro para aumentar pensionistas e reformados em cerca de 7,3% (que ajudará a amenizar a vida de muitos milhares de portugueses), tudo leva a crer que os aumentos para os trabalhadores da Administração Pública serão, mais uma vez, muito inferiores. A talhe de foice, refira-se que a presidente do BCE (Christine Lagarde) defende que não deverão ultrapassar os 2%.
Como gostaríamos de estar enganados e, num próximo artigo, fazermos aqui o nosso mea culpa. Mas, como diz o sábio povo, “gato escaldado de água fria tem medo” …
Faltam poucos meses para que o governo de António Costa apresente o OE 2023 e, como acabamos de referir, são muitos os desafios a que este orçamento terá de dar resposta, embora, e face ao que aconteceu no passado mais recente, as expectativas sejam baixas.
Reafirma-se, nunca é demais fazê-lo, a necessidade e urgência da valorização dos trabalhadores da Administração Pública, em particular dos da Administração Local, e que, após mais de uma década de estagnação salarial (que o próprio governo reconhece), se assuma como prioridade a inversão da política de baixos salários neste sector que, além do contributo directo na recuperação da nossa economia, é indispensável na valorização do trabalhadores e no reforço dos Serviços Públicos e das Funções Sociais do Estado.